Kristi Pelzel é correspondente do Today News Africa em Washington DC. Kristi se concentra no Departamento de Estado dos EUA, no governo dos EUA e nas Nações Unidas. Ela tem mestrado pela Universidade de Georgetown.
O continente africano está dando mais um salto na inovação tecnológica, e desta vez na área da saúde, passando de clínicas com pouco mais que um estetoscópio para laboratórios de sequenciamento de genoma completos.
Na última década, países como Uganda e Quênia fizeram grandes avanços no estabelecimento de programas de e-saúde e infraestrutura. Essas iniciativas foram possibilitadas principalmente por meio de ajuda e investimentos estrangeiros, mas alguns países estão começando a desenvolver sua própria capacidade indígena.
Um desses países é Ruanda, que em 2015 estabeleceu o primeiro laboratório de sequenciamento de genoma completo do mundo. O laboratório de Kigali faz parte do Centro Biomédico de Ruanda (RBC) e está equipado com tecnologia de ponta, incluindo máquinas de sequenciamento de última geração (NGS).
O laboratório foi criado com a ajuda de uma organização sem fins lucrativos sediada nos EUA Instituto Hudson Alpha de Biotecnologia, que trabalha com o governo ruandês desde 2011 para desenvolver capacidade em pesquisa genômica.
O laboratório já está causando impacto, tendo sequenciado os genomas de várias centenas de crianças ruandesas com doenças genéticas raras. Os dados gerados estão sendo usados para melhorar o diagnóstico e o tratamento dessas condições.
O laboratório também trabalha em estudos genômicos de câncer, doenças infecciosas e pragas agrícolas.
Agora, Angola está a roubar as manchetes sobre cuidados de saúde após quase três décadas de guerra civil brutal que devastou as infra-estruturas do país.
O país inaugurou recentemente o primeiro centro de medicina genômica da África, que oferecerá sequenciamento de todo o genoma (WGS) para angolanos. O centro é uma joint venture entre o governo angolano e a empresa norte-americana Veritas Genetics.
O centro ficará localizado na capital, Luanda, e deverá estar totalmente operacional em 2019, até a pandemia em 2020, adiando o cronograma.
O centro oferecerá WGS a um preço significativamente mais baixo do que o atualmente disponível nos países desenvolvidos. Por exemplo, o custo de sequenciar o genoma de uma pessoa nos EUA é de cerca de US$ 1,000, enquanto em Angola será algo abaixo de US$ 600.
Isso é possível usando uma nova máquina de sequenciamento portátil desenvolvida pela Veritas Genetics, que pode ser operado sem a necessidade de pessoal altamente treinado.
A máquina, chamada de MinION, é do tamanho de um laptop e pode sequenciar um genoma em pouco mais de uma hora.
O governo angolano espera que o centro ajude a impulsionar o sistema de saúde do país e torná-lo uma força líder em medicina genômica na África.
O centro é apenas uma parte de um esforço maior para desenvolver o sistema de saúde de Angola, que inclui a construção de novos hospitais e clínicas, bem como a formação de pessoal médico.
Espera-se que isso ajude a reduzir a alta taxa de mortalidade infantil do país, que atualmente é de cerca de 5%.
Enquanto Angola e Ruanda lideram a medicina genômica, outros países não ficam muito atrás. A África do Sul, por exemplo, tem várias instalações de sequenciamento de genoma, incluindo o recém-inaugurado Southern African Centro genômico para Controle de Doenças.
O centro é uma joint venture entre o governo sul-africano e o Instituto Wellcome Sanger, um centro de pesquisa genômica de renome mundial com sede no Reino Unido
O centro está equipado com tecnologia de sequenciamento de última geração e será usado para sequenciar genomas de pacientes com doenças raras, câncer e doenças infecciosas.
Obstáculos e corrupção
Com tantos avanços, por que os africanos ainda consideram os Estados Unidos ou a Europa como destinos de saúde?
A resposta simples é que a infra-estrutura não existe atualmente para fornecer cuidados de saúde adequados à vasta população do continente.
Isso inclui a falta de pessoal treinado, instalações e equipamentos. Além disso, há uma significativa falta de investimento nos cuidados de saúde em África.
Banco Africano de Desenvolvimento relatado na “Estratégia para Infraestrutura de Saúde de Qualidade na África 2020-2030” que “Com apenas 15% da população global, a África é responsável por 50% das mortes globais por doenças infecciosas. Os maus resultados de saúde refletem a falta de acesso a serviços de saúde de qualidade: um terço dos africanos vive a mais de duas horas de distância dos serviços de saúde e há uma grave escassez de leitos hospitalares, equipamentos médicos e medicamentos.”
Esta falta de investimento também se deve em parte à corrupção, que ainda é um grande problema em muitos países africanos.
Por exemplo, um estudo pela Transparency International descobriu que até US$ 5 bilhões foram perdidos para a corrupção no setor de saúde na Nigéria entre 2010 e 2015.
Além disso, a falta de transparência e responsabilidade torna difícil rastrear como os fundos estão sendo usados, ou se estão sendo usados. Essa falta de transparência muitas vezes torna os doadores relutantes em investir em projetos de saúde na África.
O custo do sequenciamento genômico também ainda é muito alto para a maioria dos africanos. Embora o preço do sequenciamento de um genoma tenha caído significativamente nos últimos anos, ainda está fora do alcance de muitas pessoas no continente.
É por isso que iniciativas como o centro do genoma angolano são tão importantes. Tornar o sequenciamento mais acessível possibilitará que mais pessoas acessem essa tecnologia que salva vidas.
Prevendo o futuro
Apesar dos desafios, há motivos para estarmos otimistas sobre o futuro da medicina genômica na África.
À medida que mais países africanos investem em pesquisa genômica e infraestrutura, o continente provavelmente se tornará uma força líder neste campo de ponta. Isso não apenas ajudará a salvar vidas, mas também impulsionará a economia do continente.
Além disso, à medida que a tecnologia de sequenciamento continua a se tornar mais acessível, ela acabará se tornando disponível para mais pessoas no continente. Isso permitirá a detecção e tratamento precoce de doenças e poderá ajudar a reduzir as altas taxas de mortalidade da África.
Embora ainda existam muitos desafios a serem enfrentados, o futuro da medicina genômica na África parece promissor.